Nosso refúgio certo – Salmo 90

“Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em geração”.

Com essas palavras Moisés começa seu único salmo conhecido, o de número 90. Moisés teve uma vida intensa, nascendo à sombra da sentença de morte pela ordem de Faraó para a matança dos infantes meninos hebreus; sendo resgatado antes da morte pela filha de Faraó, passa de sentenciado a príncipe, e como tal foi criado no palácio da maior potência da época. Cresce em meio a muita cultura e conhecimento, aprendendo as artes e os ofícios de liderança, até que é impelido pelos atos de Deus a deixar tudo e se juntar ao seu povo de origem com a finalidade de se opor ao seu meio adquirido e libertar os hebreus da escravidão. Passa longa jornada nos desertos e campos, onde aprende outras coisas: a lidar com o povo e a ver de perto a miséria, bem com a respirar a esperança diária do homem comum. Somente depois disso ele estaria habilitado por Deus a ser o libertador de seu povo, Israel. 40 anos de preparo nas artes e na liderança; 40 anos de preparo nos campos e nos desertos; 40 anos de liderança dura e complexa do povo de Israel até a sua libertação. 

“Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em geração”. A quais gerações Moisés poderia se referir? Às gerações de Faraós que o criaram e lhe deram status de nobreza enquanto filho adotivo? Ou terá sido às gerações passadas de hebreus criadas em meio às peregrinações dos desertos, criando cabras e ovelhas enquanto eram duramente perseguidos por seus algozes? Em nossa perspectiva natural, a primeira resposta seria a humanamente boa, próspera, com possibilidade de crescimento e de amparo, sem dores de cabeça ao logo da vida, etc. Mas Moisés se referia às gerações que estavam sob o amparo direto do Deus de seus antepassados, contando desde Abrão até os seus dias.

Como explicar a sobrevida daquele povo instável, frágil, sem maiores forças militares ou econômicas em meio a povos muito mais ricos e poderosos? A explicação possivelmente se encontrava fora das armas e das possibilidades naturais dos hebreus, mas estava no fato de que esse povo, diferentemente dos demais, tinha um esconderijo para os momentos de crise e de maior perigo. E esse esconderijo era o próprio Deus. Não qualquer Deus, mas o Deus de seus pais, o Deus de seus antepassados, ou seja, o Deus das gerações passadas. 

“Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em geração”. Com essa frase clamada por Moisés fica bem lúcida a ideia de que ele não se importava com o fato de ter precisado de cerca de 80 anos para entrar em seu ministério mais objetivo, nem mesmo reconhecendo que isso o colocaria na liderança já no tempo da canseira e do enfado (v. 10). Moisés não se importava com o fato de ter levado “broncas” de Deus ao longo de sua vida, nem se abateu em excesso pelo castigo final de não entrar na terra prometida. Ele sabia que, no final das contas, ele estava descansado no refúgio seguro que era o Senhor, único local de segurança absoluta, sem o qual jamais teria vencido tudo que venceu, nem jamais teria sido guardado de todas as tentativas de destruição por parte dos inimigos. 

“Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em geração”. Essa precisa ser a nossa oração hoje. Para onde iríamos se não estivéssemos sob a guarda e o olhar arguto de nosso Deus e Pai? Onde estaríamos após os inúmeros ataques dos dardos inflamados do maligno se o refúgio que é o Senhor? Onde estaríamos nós se o mesmo Deus não tivesse guardado nossos pais, avós, ou seja, nossas gerações passadas? Onde estarão futuramente nossos filhos se Deus não nos guardar hoje em dia? Mais que isso: onde estará nossa alma se o Senhor não for o nosso refúgio certo? De geração em geração, esse tem sido o nosso Deus, a tábua da nossa salvação, o vínculo da perfeição e a garantia de nossa vitória final. 

Joel Theodoro

É pastor efetivo da Ig. Presbiteriana do Bairro Imperial, no Rio de Janeiro, RJ. Integra o ministério Charles Simeon Trust no Brasil e é docente nos seminários Martin Bucer (SP) e SETECEB (Anápolis) e na Faculdade Presbiteriana Mackenzie-Rio. Bacharel em Letras (UFRJ), em Filosofia (CETAI) e em Teologia (Filadélfia). Mestre em Ciência da Literatura (UFRJ), Doutor em Ministério (RTS/CPAJ) e Doutorando em Letras Clássicas (Estudos Interdisciplinares da Antiguidade, UFRJ). Casado há 30 anos com Roberta, é pai de Gabriel e Rafaela.

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